Talentos

O mau palhaço

Já idoso, o palhaço finalmente chegou a algum lugar, teve o reconhecimento que sempre quis, não que o merecesse.

Nunca foi querido, sempre sem graça. O primeiro circo não lhe quis. Achou que o salário era pouco, fez mais graça do que podia, do que devia, desagradou aos donos e foi colocado para escanteio, o romance acabou depois de longa relação.

Conseguiu um segundo emprego, tinha sua plateia cativa, mas não o grande público. O tempo passou, fez a vida, arranjou umas vaguinhas para os filhos nesse emprego, filhos que repetem o pai nas mesmas sem-gracices de sempre. Arranjou uns bicos para os amigos próximos. Segundo às más línguas, recebia uma comissão deles por esses empregos. Tinha a moça que vendia sorvete, o moço do suco de laranja, tinha até uns seguranças suspeitos para o circo (ou para ele mesmo).

Com um repertório mínimo e desatualizado, conduziu sua carreira naquele picadeiro por quase três décadas. As novas piadas foram poucas e nunca fizeram o público rir, o propósito não era esse. Porém sabia se vender, falava alto, com palavreado muitas vezes inadequado para aquela função, mas que, de certa forma, cativava uma parte do público e o mantinha empregado e garantindo seus esquemas por fora.

Com o passar do tempo, as pessoas já não viam mais graça naquele circo envelhecido: os mesmos personagens, a mesma vestimenta, o mesmo linguajar. Aqueles atores já não estavam preocupados com seu público, estavam no modo automático.

O grande bufão viu aí uma oportunidade única, a chance de ouro de tomar o circo para si e aumentar sua influência e seus negócios. Comprou o circo.

Hoje reina sozinho, ou melhor, com os filhos, no picadeiro de um circo caindo aos pedaços, com a lona em chamas. O grande público finalmente descobriu que nunca ele nunca fora palhaço, era apenas mau.

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Inspiração

A ideia surgiu pelo momento vivido no país e a forma como questões fundamentais são desprezadas ou tratadas de forma desonesta.

Sobre a obra

Não usei nenhuma técnica específica.

Sobre o autor

Sou um apaixonado pela natureza e um entusiasta de fotografia. Fotografar me permite registrar os mistérios e encantos da natureza. Por enquanto fotografo apenas como hobby, mas estudo/pratico bastante.

Autor(a): JOAO PAULO BARROSO DOS SANTOS (JP)

APCEF/SP