Talentos

O Conto da Gabriela que perdeu a panela

O Conto da Gabriela que perdeu a panela

Era uma vez uma Gabriela
Melhor que aquela de Cravo e Canela
Porque além de saber encantar
Bem coser e cozinhar
Essa sabe realmente a vida aproveitar

Gabriela acredita que Felicidade é sinônimo de coletividade
Que tem que insistir em ser feliz
Até que a tristeza dê um sorriso blasé
E diga: - Quer saber? Cansei de você.

Por isso ela tem mania de unir todo mundo
Como fez, certa vez, com Dona Amélia e Sr. Raimundo
Duas solitárias metades que se descobriram como casal
Num arrasta-pé frugal em seu fundo de quintal.

Gabriela pensa que tudo na vida tem que celebrar
E que o sucesso disso é uma questão de se adaptar
Sendo assim, se a festa for informal
Como foi aquele sarau de Dona Nita
Ela vai feliz de chinelo e vestido de chita.
Mas se for uma recepção de gala na mansão do Governador
Com prataria francesa e croissant
Ela, num instante, troca de escritor
Põe Jorge Amado na estante
Incorpora Maupassant
Veste o longo de sêda e calça o scarpin.
Só não abre mão de em todos dar um cheiro
E pôr a flor no cabelo.
Pra Gabriela, um bom dia sincero
Com um sorriso singelo
Já serve pra alegrar
Mas...ela gosta mesmo é de gargalhar
Igual como aconteceu
Quando Caymmi a conheceu
Ele nem precisou passar uma tarde inteira em Itapoan
Bastou um simples café-da-manhã
Moído na hora e com bolo de fubá
Pra rir até engasgar
Como pra Dorival tudo era musical
Ele foi proseando com Gabriela e rindo cada vez mais em ré maior
Até que pegou lápis, pauta e violão
E disse: - Preciso refazer o refrão daquela canção.

Assim, tudo ia bem na vida de Gabriela
Até o dia em que deu por falta de sua panela.
Ela revirou a memória e a cozinha procurando sua panela de pressão
No dia em que queria fazer um feijão.
No desespero, abriu o berreiro.
O outro Jorge, o amado dela, espantado exclamou:
- Amor!? Que aconteceu? Você nunca chorou!
Gabriela explicou.
- Se preocupa não, amanhã compro outra. Disse ele.
O filho roqueiro acrescentou:
- É Pai! Compra essa aqui da internet que tem selfie do andamento do feijão
E avisa que tá pronta em português, inglês e alemão.
- Quero saber disso não! Soluçava Gabriela.
- Eu quero aquela que me entendia só de olhar.
Na mesma hora, toca o celular.
É painho chamando na tela.
-Filha!? O que houve? Senti um aperto no coração.
-Ahh! Pai! Roubaram Ceição!
-Quem??? É alguma nova vizinha?
-Não Pai! Lembra não?? É aquela panela de pressão que você me deu no enxoval do casamento!
-Esse povo não tem sentimento! Isso é coisa de gente que pensou que roubando a panela,
Aprenderia o seu segredo pra bem cozinhar nela.
-Procura a polícia. Dá queixa dela.
Como Gabriela acreditava que conselho de pai é pra respeitar. No dia seguinte, na Delegacia da Mulher, tava lá aquele duelo de mãos nas cadeiras, de um lado a Delegada balançando as dela dizia:
-Era só o que me faltava. Já vi gente que perdeu jóias e bicho de estimação, mas registrar ocorrência de panela de pressão??
Do outro, Gabriela, balançando as dela:
-Ué!!! Mais isso não é uma agressão? Roubar uma panela de uma mulher??
A discussão tava exaltada quando o Prefeito ligou e ordenou:
- Registra. Porque Gabriela é celebridade da região.
E assim, na outra manhã, foi publicado no Diário Oficial da União:
ROUBO DA PANELA DE GABRIELA
RECOMPENSA:
ALMOÇO NA CASA DELA.
Quando outro dia amanheceu e Gabriela abriu a janela,
Deu de cara com uma fila imensa de gente batucando panela, dizendo ser a dela.
Foi aquele panavoeiro ,
Veio cão farejador e até bombeiro.
Perito policial pra ajudar no reconhecimento
Que após horas, não teve desenvolvimento.
De repente, Gabriela recebe uma ligação, era Nakamura, sua antiga vizinha que tinha se mudado há um tempão.
Minutos depois, Gabriela volta a sorrir, pega o megafone do policial e grita do portão:
-GEENTEE !!! ACABOU A CONFUSÃO!
-Minha panela tá no Japão.
Daí ela pensou: - Bom!! Já que não tem jeito então... vamos aproveitar o feijão e alimentar o povão.
E assim, virou tradição,
Todo ano, um mês após o São João
Tem Feijoada do Sumiço da Panela de Gabriela na Rua Constelação.

Geo Cardoso.

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Inspiração

O conto surgiu de uma postagem no face de uma amiga que tinha perdido a panela de pressão e que começou a perguntar a todo mundo se tinha emprestado.

Sobre a obra

Utilizei de uma mistura de narrativa e diálogos com rima para tornar o texto mais interessante.

Sobre o autor

As vezes, o escritor e o pintor tomam de surpresa as rédeas do meu tedioso cotidiano.

Autor(a): GERVASIO CARDOSO PEREIRA JUNIOR (Geo Cardoso)

APCEF/BA