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EVOCAÇÃO
EVOCAÇÃO
(A caminho de Olinda... volto na segunda)
Quem, a caminho de Olinda,
Há de voltar na segunda,
Banha com chuva bem-vinda
A paisagem que me inunda.
Volta com sombrinha à praça
E, ao agitar-se, entrelaça
A transparência das horas...
Agacha, sobe e se lança,
No passo - a distância, a dança...
Em marcações vida afora.
Oh linda, vais a caminho...
E eu já nem sei de onde venho
Mas passeio em desalinho
Com alegorias que tenho.
As sombras vão, na neblina,
Dos calcanhares aos dedos,
Cambaleando arremedos
De Arlequim e Colombina.
São sonhos de purpurina,
De frevos, choros, cirandas...
E, se te elevo às varandas,
Dama do meu bruto engenho,
Vives na arte em que me empenho
Por onde ando... por onde andas?
Oh linda, vai... que há folia
Nesse teu jeito senhora
E, por ele, a poesia
Pouco a pouco me devora.
No massapê teu cortejo
Ondeia os canaviais
E, em meus tímpanos, metais
Ainda calam o desejo.
O adiamento de um beijo
Na placidez do teu siso,
Retoca o passo impreciso
(Que um choro deixou às claras),
Quando a Orquestra Tabajaras
Repõe teu passo onde eu piso.
Oh linda, sigo teu facho
Sob as bênçãos de Capiba,
Um choro ladeira abaixo,
Um frevo ladeira arriba.
A palha da cana estende aos tambores,
De cada máscara, o pulso de espanto.
E entre bonecos pelos Quatro Cantos
Sigo estandartes de riso e de dores.
Por Evocação, o Bloco das Flores,
Andaluzas, Pirilampos e, enfim,
Toda uma história aguarda o clarim
De um frevo-canção, de um mangue sem beira,
E a ode sonora de Nelson Ferreira
Espalha em confetes rumores de mim..
Oh linda, és serenata
Pluma negra erguida à crina,
E a máscara rubra e prata
Te lampeja em cada esquina.
Passam sobrados, mocambos
Casas grandes e senzalas...
Teus risos e andares bambos
Entre o alvoroço das falas,
Circundam-me em piruetas.
Sigo o norte das sarjetas
Paralelo a onde caminhas.
Não importa se é inexata,
A máscara que arremata
Tua fantasia e a minha.
Oh linda, se é sem espaço
Nosso rolar por ladeiras,
Vou recompondo teu traço
De adegas a gafieiras.
Olinda, já és Nazaré
Da Mata em Maracatu,
Do meu canto sanhassu
És o improviso de fé.
Oh linda, porque és mulher,
Cujo gesto é meu quebranto,
Boio em teu olhar de espanto,
Vendo que vês, na sangria
De vinho, minha agonia
Em frevo por todo canto.
Mas já retornas, oh linda,
Ao teu salão principal
Antes que, segunda, ainda
Te imagine em carnaval.
Pseudônimo: Corsário
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Inspiração
O texto apresentado inspira-se na tentativa de traduzir desencontros previsíveis, pela analogia com as ocorrências aleatórias de um carnaval pernambucano. Como se fosse um enredo contado a partir de um observador, que se insere no enredo, mas assiste a evolução do tema como se aquela vida se passasse numa vitrine inacessível.
Sobre a obra
O texto já nasce estruturado em estrofes com métrica e modulação de rimas variadas (quadras, décimas e decassílabo), aproximando-se de modalidades do repente nordestino para fazer uma alusão a elementos, cenas e personagens da história e cultura locais. Nesse contexto é que se cria o paralelismo com o motivo central do poema, que é o desencontro.
Sobre o autor
A tentativa de escrever poesias é algo que me distrai (e tornou-se imperativo em mim) há muitos anos, desde quando, na adolescência, tentava entender as motivações interiores dos grandes poetas e, ppor conseguinte, as minhas motivações. Quanto mais enveredo no trato do potencial poético das palavras, mais me considero poeta por teimosia.
Autor(a): CLEUDON CHAVES JUNIOR (CORSÁRIO)
APCEF/CE
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