AS RUÍNAS DA SANTA GLÓRIA´

A Magia da Santa Glória


Nosso pai montava a cavalo e sumia para o campo sem fim, a perder de vista. Minha mãe ficava cozendo e cuidando da llida da casa. Mais tarde ele apareRcia campeando o gado e de longe ecoava sua voz: oop! oop! oop! Inêz, Marta e eu ficávamos a espera no curral para receber as vacas. A nossa preferida era a Cafeteira e sua amiga Raposa. Uma vez a Cafeteira machucou-se e a Raposa adotou o bezerro dela. Isso nos comovia muito.
Ficávamos eu, Inêz e Marta procurando distrações naquele lugar semi-abandonado, pois só íamos para lá nas férias e meus pais eram desmazelados, ou talvez não sobrasse tempo para cuidar da estética da fazenda. Eram muitos filhos, muita terra, muito gado e, portanto, muito trabalho.. Certa vez, sentindo-me entediada, pedi para minha mãe fazer uma boneca. Ela foi fazer e eu fiquei aguardando ansiosa.. Quando ficou pronta, minha reação foi de decepçãp, pois era apenas uma almofadinha, com olhos, nariz e boca, bordados à mão. Mas os recursos eram escassos e hoje eu admiro a boa vontade que ela teve.
Uma das nossas distrações era ver no final da tarde a casinha do João de Barro fechar-se: era às seis da tarde, o horário da Ave Maria, e acreditávamos que ele fechava a portinha para abrigar Nossa Senhora
Não posso esquecer da égua Queimada, mansinha noa levava para passear toda a tarde. Morria de pensa dela, pois além de estar velha, tinha uma ferida no lombo, mas cumpria humildemente sua missão.
Hoje, trinta anos depois, estamos eu, Nelson e nossos filhos, Antonio e Luíza, tentando tentando construir uma nova história e passar para nossos filhos todo o encanto que eu sentia naquele lugar.. Estamos tentando reerguer o Império da Santa Glória, um Império de emoções, de luta, de aceitação e humildade




O NASCIMENTO DAS GÊMEAS

Era uma grande casa, tão grande como o coração das pessoas que ali moravam: Jaime, Joana, Dora, João e Deise. Naquele casarão da fazenda dos Veados, com grandes janelas e um enorme salão de tábua corrida, morava a família Araújo.
Era lá que meu pai e minha mãe lutavam para o sustento da família com o auxílio dos fllhos - João e Jaime vestiam uma capa de saco de sal e descalço iam ajudar meu pai.
O ambiente tinha uma aura de pureza e tranquilidade o que propiciava o sono da tarde de Deise, a mais nova. Mas uma notícia veio tirar-lhe do sono: o nascimento da gêmeas, quando então perdeu o seu prestígio de caçula e viu seu mundo ruir. Foi algo que lhe causou susto e decepção,mas depois de passado o tempo, ela relembra com saudades desse momento de sua infância, tão cheio de amor.



Personalidade Ímpar

Essa foi a história do meu pai, segundo a narrativa de um primo meu:
Era sempre visto em cima de um cavalo, e grande em tamanho e em caráter, começou a vida com simplicidade extrema junto de minha mãe, na fazenda Palmeiras - um sertão onde não se via uma alma viva, com difícil acesso para a cidade, pois não tinha ponte para passar o rio das Velhas, precisando atravessar o rio de canoa. Todos nós parentes achávamos que foi muita coragem dele por estar morando num lugar ermo onde só tinha pedras e tamanduá bandeira - dizíamos em tom de brincadeira. Com o passar dos anos, ouvia-se com frequência de suas conquistas - Ele está ganhando dinheiro com o negócio de porcos, outra hora, ele está fazendo dezoito queijos por dia, ele já comprou mais um pedaço de terra, ele está ficando rico...E então comecei a admirar ainda mais aquele homem, tornando-se uma de minhas referências - “quero ser igual a ele quando eu crescer” dizia para minha mãe. Lá pelos 10 anos, ouvi dizer que tinham construído a ponte das Palmeiras e aí ficou mais fácil encontrá-lo. A epopéia do tio Oswaldo continuava, vinha notícias de que ele tinha comprado uma boa fazenda chamada de Veados, depois, que ele tinha comprado um caminhãozinho. E todos festejaram - agora temos uma garupa para a cidade.
Eu, com 19 anos e morando na cidade de Sacramento, e ele também com sua grande família, acabei por resolver tentar a vida em São Paulo, trabalhar e continuar os estudos. Era uma aventura para um garoto ainda novo. Eu passei a notar que todas as vezes que vinha visitar os meus pais, a primeira visita que chegava em nossa casa era o tio Oswaldo. Em meu casamento, lá no início dos anos 70, lá estava ele presente. E vejam que nessa época, os deslocamentos eram demorados por precariedade dos veículos e da estrada.
Quando eu e meu irmão, lá pelo início dos anos 80, compramos aqui em Sacramento a nossa fazendinha, que é parte daquela onde nasci, ele festejou a nossa iniciativa, como se fosse ele que estava comprando - esteve conosco em todas as etapas, acompanhando, orientando e até percorrendo a pé toda a sua extensão.
Uma das coisas que admirava no meu tio, foi a sua generosidade, mesmo com uma família de doze filhos, achava tempo para se preocupar com os sobrinhos. Tio, a sua partida me deixou um vazio imenso, igual àquele que senti quando mudou-se para as Palmeiras, lá nos meus longínquos cinco anos
Obrigado por seu carinho, sua atenção, pelas cavalgadas e sobretudo, por seu exemplo.
Você foi não só um homem grande, mas também um grande homem, não só para mim, mas por todos aqueles que tiveram a oportunidade de conviver contigo.
Éramos em nove irmãs e três irmãos, um time de futebol, segundo alguns diziam, como os doze apóstolos, outros diziam, a irmandade Araújo, uma amiga dizia, mas enfim, era uma confusão alegre, o dia todo a casa cheia de gente, sempre tínhamos visitas e a rua então: cheia de crianças no final da tarde, pois a vizinha da frente e a do lado tinha igualmente doze filhos.
Com o tempo foram ocorrendo as mudanças: as casas cederam lugar para o comércio e o pessoal amigo mudou cada um para um lugar diferente… o que resta hoje é o contato pelas redes sociais, o que é bom, mas longe de ter a afetividade de antes. mas alguns ou algumas se agarraram a essa alternativa, como minhas irmãs, que saudosas umas das outras, fizeram do whatsapp um consolo e um verdadeiro blá-blá-blá: elas contam casos e mais casos sem trégua, não existe um fim, com destaque principal a Zezé e Dorinha com a animação delas, a Marta é a articuladora principal com a sua habilidade em contar detalhes, a Deise, toda araújona, sempre participativa, a Joana, bem discreta, sempre surge com algum comentário, a Dora acha um ótimo espaço para contar seus casos e desabafar sua vida, a Inêz sempre vem com uma notícia nova para animar a turma, a Bebel também não fica atrás, como caçula, adora acompanhar a irmandade, que aliás, diga-se de passagem, deve ser a mais animada das redes sociais,o bate papo mais caloroso das conversas virtuais - sempre um aniversariante para cumprimentar, pois inclui-se nesse grupo todos sobrinhos e cunhados, fotos de viagem para que a galera não perca nada e ainda sobra espaço para as piadas. E os sussurros, risadas, choros, tudo com muito requinte, sem sobrar comentário algum, a quarentena que o diga, que aliás, foi um tema excelente para esquentar as conversas. O Covid aparece como o melhor tema do momento e em segundo lugar, as histórias de família, incluindo casos de toda a parentaia. E eu, ainda estou perdida, tentando achar um começo, meio e fim...

SAUDADES DA SANTA GLÓRIA

Foi uma venda repentina e com muita resolução,
mas que cortou o meu coração,
a venda da Santa Glória
terra abençoada de um forte chão. Era a égua Queimada, o João de barro, a vaca Cafeteira, tudo tinha vida e uma simbologia que
marcaram a minha infância,
seu clima ameno, brisa suave e silêncio profundo
sussurrava coisas boas na minha imaginação
Os eucaliptos, o bambuzal,os pássaros, as matas, as rês e outros animais
Todos tinham um nome e um ruído próprio

do ponto de vista da criança, tudo isso era especial e enchia sua imaginação
Fica hoje a presença amorosa de meu pai e minha mãe, fica um sentimento genuíno e de pureza, no qual eu plantei minha semente e hoje é minha raiz







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Inspiração

Eu trago uma memória muito bonita da minha infância, que foi um momento cheio de magia e imaginação - e isso me deslumbra em comparação com a mecanicidade da vida de hoje, principalmente nas grandes cidades e nos trabalhos urbanos

Sobre a obra

Eu trago uma memória muito bonita da minha infância, que foi um momento cheio de magia e imaginação - e isso me deslumbra em comparação com a mecanicidade da vida de hoje, principalmente nas grandes cidades e nos trabalhos urbanos

Sobre o autor

Meu nome é Beatriz, estudei Letras e gosto muito de literatura e redação, porém, perdi o hábito de redigir e não sei se tenho algum talento especial

Autor(a): BEATRIZ DE FATIMA ARAUJO (BEATRIZ)

MG