O Fogão

O Fogão

Naquela noite de sexta-feira recebera o pagamento do mês. Estava exausto, faminto, não havia almoçado naquele dia. Mesmo assim, recusou acompanhar os amigos na velha condução, preferiu ir a pé.
- Hoje vou a pé. A passagem tá cara, preciso economizar, vou comprar um fogão - disse Carlão aos amigos.
Carlão era um dos operadores de esteira - homem de traços rudes, com barba por fazer, trazia em seus olhos muita mágoa pela morte tão prematura de sua mulher, tornara-se raquítico. Somente mantinha o apelido Carlão por costume dos amigos.
- Não quer realmente vim conosco? É perigoso andar com tanto dinheiro, disse Seu Pereira.
- Não. Vou pra casa conversando com Deus. Despediu-se com um sorriso.
Caminhava a passos largos e rápidos, a fome apertava ainda mais, precisava chegar logo em casa para jantar.
- É melhor pegar um atalho, falou em voz baixa.
Carlão, então, enveredou pelo beco das Flores que ligava a Avenida Norte com a favela onde morava. Dessa vez, a sorte fugiu.
- Perdeu, perdeu...anunciou um nervoso ladrão.
-Vá passando tudo aí - dizia com uma arma apontada para o Carlão. Entregou o envelope do pagamento ainda lacrado.
- Corre, corre vagabundo e não olhe pra trás, gritava o assaltante.
Correu, escorregou, caiu, levantou e chorou.
Ao chegar em casa, a filha pergunta a Carlão.
- E aí pai, vamos comprar o fogão amanhã?
- Vá no depósito, peça carvão e avise ao Seu Messias que pago no mês que vem. Essa foi a resposta.
Enquanto isso, do outro lado da cidade, noutra favela.
- O que há dentro desse envelope? indagou a garota.
- É o fogão da sua mãe - respondeu o ladrão.

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Inspiração

contradições da vida que percebi em folhetins policialescos.

Sobre a obra

suscita, direta e intensa. objetiva ao passar sua mensagem.

Sobre o autor

época de faculdade até escrevia, mas a luta diária me fez parar de escrever, mas sempre busquei ser direto em contos que retratam realidades.

Autor(a): PAULO CESAR BENICIO MARIANO (Martim Alencar)

APCEF/CE

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