Maria, como tantas outras!

Maria, como tantas outras!

Maria dos Prazeres da Silva! Mulher preta, viúva, idade não declarada; embora os cabelos em parte encanecidos, as rugas e a gravidade indiquem mais de 50. Tem três filhos vivos. Um morreu atropelado por um motorista bêbado: Traumatismo craniano. Não resistiu ao impacto do aço do para choques em sua cabeça repleta de sonhos.
Também fez um aborto na adolescência; uma gravidez inesperada fruto de um amor bandido. Teve medo que o filho trilhasse o caminho do futuro pai. Estudou pouco; começou a trabalhar cedo para ajudar no sustento da casa. Esta é Maria, cujos prazeres só mesmo no sobrenome; pois os poucos que teria, são toldados pela dura e fria realidade na qual está inserida.
Cria sozinha os três filhos e um cachorro vira latas com nome de político. Foi casada duas vezes, mas enviuvou de ambos; um morreu com tiro no peito, e outro com cirrose no fígado. Resolveu ficar sozinha, por falta de oportunidade e de pretendentes. Talvez o seu histórico de viuvez afastasse os homens.
Embora forte, tinha alguns medos: Medo de bala perdida, de doença encontrada, dos filhos escolherem um caminho errado, pois por experiência sabia que o destino é certo: Cadeia ou cemitério. Também tem medo da fome; pois conviveu de perto com ela por muitos anos, e se apavora só de pensar em encontra-la de novo.
A casa é pequena e com pouca mobília, sua maior riqueza são os filhos com nome de artista: Maicou Douglas, Dieneiffer Lopes, e o caçula Antônio Banderas em homenagem ao galã espanhol e a seu pai recém falecido: Seu Antônio da Quitanda. Quando do nascimento do primogênito, no cartório o rapaz tentou convencê-la a registrar “Michael Douglas”; porém desistiu ao ser repreendido veementemente pela intromissão.
No registro dos outros dois, se limitou a sugerir o “R” no final do Dieniffer, e a tirar o “I” do Bandeiras. Disse que Banderas era mais chique. A mãe gostou da sonoridade, e aceitou as sugestões. O detalhe é que todos eles carregam o “da Silva” no final.
É sexta feira, Maria confere atentamente o resultado da mega sena. Ainda não foi desta vez! Reclama baixinho que não tem sorte no jogo. Nem no amor, nem na vida... ouviu alguém falar na internet que sorte é quando a oportunidade encontra com a preparação. Ela não tem nem uma nem outra.
Em casa: Lava, passa, cozinha, arruma... no trabalho faz a mesma coisa, só que em maior proporção. À noite ainda faz pão caseiro para complementar a renda. Insiste para os filhos estudarem para que tenham um futuro melhor; sonha em vê-los formados. Eles não partilham dos mesmos sonhos.
Deslumbrados pela fama e dinheiro; os meninos querem ser jogador de futebol; a menina, cantora de funk. Ela até já escolheu um nome artístico: “Dieniffer Pega Geral”! A mãe desconhece este detalhe.
Seus poucos momentos de descontração e leveza, se resumem ao pagode de quarta-feira à noite no final da rua, quando então bebe uns copos de cerveja barata, e ri com as amigas falando da vida alheia, ou então assistindo a novela preferida na sua TV de 32 polegadas que fala com orgulho que comprou à vista.
Assim é a vida de Maria. Como a de tantas outras mulheres espalhadas por este imenso Brasil; que lutam diariamente, sendo provedoras e protetoras de seus filhos, invisíveis para muitos, mera estatística para alguns, mão de obra necessária para outros; mas que não se curvam ante as dificuldades e obstáculos da vida, e carregam sempre a esperança de que seus filhos rompam esta bolha e tenham uma vida melhor. E vez ou outra um deles consegue!

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Inspiração

Mostrar a realidade de muitas mulheres do nosso país, que trabalham em casa, trabalham fora, criam sozinhas seus filhos, e mantém a esperança de um mundo e uma vida melhor.

Sobre a obra

A obra mostra a realidade de muitas mulheres do nosso país, que trabalham em casa, trabalham fora, criam sozinhas seus filhos, e mantém a esperança de um mundo e uma vida melhor. Gosto de escrever sobre temas do cotidiano, e este é um deles,

Sobre o autor

Sou um amante da arte em suas diversas manifestações, e a literatura faz parte da minha vida desde muito cedo me aventurei a escrever sobre coisas que vi e vivi, procurando imprimir uma linguagem própria.

Autor(a): EDIO WILSON DE SOUZA SANTOS (Pena D'ouro)

APCEF/ES