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Silêncio que Grita
Silêncio que Grita
Era um dia comum, como tantos outros. O relógio marcava as horas com sua precisão incansável, e as ruas seguiam o ritmo frenético da cidade. No meio desse cenário ordinário, ela estava lá, quieta. Sentada no banco da praça, parecia uma estátua que olhava o mundo passar, enquanto segurava uma sacola de mercado e uma bolsa gasta pelo tempo.
Seus olhos, cansados, diziam mais do que qualquer palavra poderia expressar. Não eram só olhos; eram abismos. Tinham a profundidade de quem já viu muito, de quem já sentiu o peso do mundo nas costas e o silêncio na garganta. Um silêncio que não é mudo, mas grita.
A violência contra a mulher não é feita só de socos e empurrões. É feita de olhares ameaçadores, palavras cortantes, de medo e controle. É o “você não é capaz” repetido tantas vezes que se torna verdade. É o “ninguém vai acreditar em você”, que cala qualquer tentativa de buscar ajuda. É o círculo vicioso que começa com um pedido de desculpas e flores, mas que termina sempre no mesmo lugar: dor.
Pela cidade, quantas outras mulheres não carregam a mesma sacola pesada, feita de sonhos desfeitos e esperanças perdidas? Quantas vozes abafadas pelas paredes de casa, onde o grito jamais escapa? A violência é um espectro que se alimenta do silêncio, do medo, da vergonha. Ela se esconde nos detalhes, nos olhares desviados, nos braços cruzados. Ela veste tantas roupas que se torna invisível.
A sociedade segue em frente, ocupada demais para notar as fissuras, os gritos contidos nas entrelinhas do cotidiano. Afinal, é mais fácil olhar para o lado, fingir que não viu. É mais confortável acreditar que o problema é do outro, da porta ao lado.
Mas um dia, enquanto o relógio segue contando as horas e o movimento da cidade não para, ela levanta. É um movimento quase imperceptível, mas é o começo. O começo de um passo, de uma decisão, de uma voz que, cansada de gritar para dentro, finalmente resolve ser ouvida. Ela caminha até a delegacia mais próxima, passa pela porta pesada, encara a recepcionista com olhos ainda marejados, mas agora determinados.
Não é fácil. Nunca é. Mas é o início de uma mudança. Uma mulher levantou e, com ela, o peso de muitas outras que ainda estão sentadas em seus próprios bancos de praça, segurando suas sacolas cheias de silêncio. Talvez amanhã seja o dia delas. E quem sabe, um dia, essa crônica possa falar de uma violência que ficou para trás, superada pela coragem de tantas que decidiram não se calar.
Porque o silêncio é poderoso, sim. Mas quando quebrado, ele é capaz de transformar o mundo.
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Inspiração
O que me motivou foi a angustia que sinto ao ver noticias todos os dias de mulheres morrendo
Sobre a obra
Escolhi um tema forte de interesse publico e narrei, descrevi
Sobre o autor
amo artes conto poesia cronica fotografia
Autor(a): ALINE SANTOS BARRETO (ALINE BARRETO)
APCEF/BA