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INGLES PARA INGLES VER
Muitíssimo cedo – pelo menos para quem gosta de "dormir como gato de hotel" -, umas 7h, da manhã ensolarada da cidade de Piripiri, no Piauí, fui ao oftalmologista para ter um diagnóstico que justificasse eu andar me desviando de todo mundo que conheço por medo de não as enxergar, reconhecê-las e as cumprimentar como sempre faço quando os óculos ajudam. Na entrada, na luxuosa porta de vidro da clínica tinha escrito "PUSH" e eu comecei a puxar a porta que teimava em não abrir, parecia um muro, fixa e imóvel. Franzi a testa e fiquei pensando comigo "será que eles deixam as portas trancadas é por medo de assaltantes?". Sem conseguir abrir a porta na primeira tentativa fiquei em pé junto dela, parado, com aqueles olhinhos “pidão” do Gato de Botas esperando que a recepcionista corresse para abri-la. A moça fardada com lacinho verde no pescoço fazia um movimento estranho com a mão como se estivesse tirando o excesso de água do balcão com um rodo invisível e eu, é claro, fiquei sorrindo tentando interpretar aqueles movimentos desesperados da mão, da boca e dos olhos dela até que um cliente que já estava dentro da clínica levantou-se e me abriu a porta, puxando-a em sua direção e dizendo "você estava tentando abrir a porta de maneira errada, deveria empurrá-la e não puxar como fez". Eu tentando me explicar, mostrei o que estava escrito na porta (PUSH) e disse que a culpa era deles que haviam errado na inscrição, que eu já havia notado o erro de português assim que cheguei, pois puxe é escrito com "XE". Todos os presentes se dobravam de sorrir da minha explicação ingênua e, entre uma gargalhada e outra, a moça de lenço no pescoço me explicou que o termo na porta estava em inglês e se traduzia para o português como "empurre", o que me confundiu desde o início. Definhei de vergonha numa cadeira meio escondida de todos que ali estavam, peguei duas revistas velhas na mesa de centro e comecei a lê-las com a cabeça mergulhada entre as páginas como se a miopia estivesse no patamar dos 50 graus, assim eu esperava que todos esquecessem o vexame de minutos antes. Ao sair da clínica com um sorriso amarelo e sem graça no rosto fui para casa atrás de começar um curso de idiomas naquele minuto. Cheguei a me matricular em dois cursos de língua inglesa, mas acabei desistindo de ambos. Não tenho ainda fluência no idioma norte-americano/inglês, mas de uma coisa eu não esqueço: “push” significa “empurre” em português e “pull” traduz-se como “puxe”. Agora me respondam umas coisas: por que diabos não colocaram um adesivo em língua portuguesa naquela bendita porta? Quantas pessoas mais passaram pelo mesmo constrangimento que eu? Será que pelo menos um dia já foi um falante de língua inglesa naquela espelunca? A raiva que tenho daquela porta com seu adesivo em inglês não está escrito. E é isso.
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Inspiração
Uma crônica que fala de uma experiência constrangedora e também engraçada que vivi durante uma consulta ao oftalmologista.
Sobre a obra
Trata-se de uma crônica, gênero textual curto e de prosa, que aborda acontecimentos do cotidiano.
Sobre o autor
Sou um buscador de sabedoria, amante do Bem e do Belo. Ando em busca de me tornar um homem mais sereno, fraterno e pacificador de conflitos onde eu estiver. A arte, em geral, ajuda-me nesta caminhada.
Autor(a): EDELSON PEREIRA DOS SANTOS (EDELSON PERSAN)
APCEF/PI