EU E MARIA RITA

EU E MARIA RITA

Ainda nos idos de 1970, na cidade de Parnaíba, estado do Piauí, na plenitude dos meus 14 anos, o tema da chegada do homem à Lua ainda fazia parte das rodas de conversas com meus colegas de estudos e brincadeiras. Não sabíamos muito, mas era bom ficar olhando para a lua e idealizá-la como uma esperança de vida feliz. Assim, despretensiosamente, era os nossos sonhos nos anos 70.
Hoje, saudosamente, ao relembrar esses tempos, vem ao meu coração a lembrança de Maria Rita, que vou buscar no meu baú de memórias, a mais bem guardada das histórias: Ao dobrar a esquina e passar por uma rua próxima à minha casa, seguindo em direção ao colégio, que ficava nas proximidades, havia na segunda casa, do lado esquerdo da rua, que, por coincidência ou não, quem sabe? Sempre tinha uma menina na janela. Faces pálidas, cabelos castanhos e cacheados, não muito longos. Ela deixava sempre transparecer um sorriso discreto, o qual eu interpretava como uma permissão para algum tipo de cumplicidade. Outras vezes, eu era possuído por um medo paralisante, pois, não sei explicar, supunha que a garota pudesse estar zombando de mim. Ao dobrar a esquina, no meu espírito vinha a enorme vontade de ver a garota e, em simultâneo, eu torcia para que ela não estivesse lá, pois assim eu não perderia o jeito de caminhar. Estava lá... Eu respirava fundo, não sabia para qual dos lados olhar, não sei se sorria devolvendo o sorriso dela ou se ficava parado. Parado, sei que não ficava, mas o meu caminhar era por certo desconcertante e, por vezes apressado. Era um misto de prazer e sofrimento, nunca soube explicar àquela situação.
Um determinado dia, acordei decidido, iria parar e falar com a garota, iria dizer “Bom dia!” Sim, senhor! O resto deixaria que Deus me ajudasse. Com a bolsa de livros e caderno a tiracolo, caminhei seguro, dobrei a esquina e... Ela não estava lá... Fiquei meio sem jeito e sem saber o que fazer, olhando para a janela aberta. E agora? O que houve? Decidi por esperar um pouco e fiquei quase que embaixo da janela. Eis que aparece uma senhora idosa, com um sorriso franco, olha para mim e com a maior naturalidade do mundo, diz: “Ah, você não sabe? O Pai da Maria Rita levou ela para casa, vai estudar por lá agora.” Mas que coisa! Eu não pude falar nada, acredito que soltei um sorriso amarelo e triste. Saí levando comigo toda a tristeza do mundo e, dentro de mim, travei um tremendo diálogo, no qual eu chegava, dava bom dia para Maria Rita, entregava-lhe uma flor, curvava os joelhos e pediria: “Maria Rita, quer namorar comigo?” Julgo que, de tudo que guardei de mais sagrado, ficou este ponto de luz, que me fez ter orgulho de mim mesmo. Não fiz, não destravei, mas também não tive oportunidade de tentar e isto guardo como se tivesse feito. Sempre surge no meu íntimo o sorriso de Maria Rita, como se ela nunca tivesse oferecido aquele sorriso a outro garoto. Não, eu preciso acreditar que aquele sorriso era só para mim.
Sagrada seja essa fase da minha vida, sagrada seja a fase de Maria Rita, a qual, sempre que me vem a lembrança, vejo correndo, cantando e feliz na vida que deverá ter até hoje.

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Inspiração

A ideia surgiu quando rememorava momentos da nossa adolescência.

Sobre a obra

É uma narrativa dos anos dourados de nossa adolescência.

Sobre o autor

Sou aposentado e tenho como passa tempo escrever poesias e contos.

Autor(a): JOAO SALES NETO (JOÃO SALES NETO)

APCEF/PI