“Navegar é preciso, viver não é preciso” e sonhar é a bússola

“Navegar é preciso, viver não é preciso” e sonhar é a bússola

Quando ouvimos a frase “navegar é preciso, viver não é preciso”, logo pensamos na genialidade de Fernando Pessoa, poeta português que a imortalizou num poema, no qual atribuiu o seu sentido de vida à criação.
O poeta da querida “terrinha” utilizou-se muito bem dessa expressão de autoria do general Pompeu, que a criou por volta do ano 70 a.c., segundo registros do historiador Plutarco.
Diante do desafio que recebeu de salvar a grande metrópole Roma, que enfrentava o desabastecimento de alimento devido à revolta dos escravos, Pompeu lançou as embarcações ao mar para transportar trigo enfrentando grandes perigos, desde a ausência de recursos tecnológicos que orientassem a navegação, até ataques de piratas. Para encorajar os seus marinheiros a enfrentar a forte tempestade que aterrorizava, subiu a bordo e disse: “navigare necesse est, vivere non est necesse” - navegar é necessário, viver não é necessário.
Diante desse contexto, presumo que o general Pompeu entendia que era justificável o sacrifício da sua vida e dos seus marinheiros em prol do abastecimento e vitória de Roma, talvez até uma vitória para si.
O genial Fernando Pessoa, no famoso poema, transformou a frase substituindo o termo “necessário” por “preciso”. Será que a sua intenção foi de gerar uma confusão semântica entre precisão e necessidade? Até hoje se discute o assunto.
Penso que isso não importa, uma vez que a poesia sempre supera o poeta, pois é de livre interpretação! Analisando versos do poema de Pessoa, percebo que tanto ele quanto Pompeu atribuíram sentido semelhante, mas não idênticos, às palavras em questão, isto porque para eles “viver não é preciso ou necessário”, diante da grandiosidade dos seus objetivos, quais sejam: o general de salvar Roma de um colapso, o poeta de abastecer a nossa alma de criação, pois criar para o poeta é mais importante que viver! No entanto, Pessoa, como poeta que é, atribuiu um significado mais amplo para o termo “preciso”.
Veja um trecho do poema do fantástico Pessoa: “Não conto gozar a minha vida (...) Só quero torná-la grande, ainda que para isso tenha de ser o meu corpo e a minha alma a lenha desse fogo (...) Só quero torná-la de toda a humanidade(...)” - Para ele beneficiar a humanidade com os seus versos era fundamental, mesmo que para isso custasse o sacrifício do seu corpo e da sua alma! Palavras de poeta no auge da criatividade!
Eu confesso que quando ouvi essa frase pela primeira vez – navegar é preciso, viver não é preciso -, a minha reação imediata foi ficar chocada, pois de plano atribui o sentido de “necessidade”, ao termo “preciso”, ou seja: navegar é necessário, viver não é necessário – como se os meios justificassem completamente os fins. Mas logo depois, lendo-a com mais profundidade e mente aberta, percebi a dualidade do significado da palavra “preciso”, que neste caso não significa precisão, pois viver não tem uma precisão métrica!
Viver não é algo matemático, exato, ou cheio de instrumentos! Viver é terrivelmente ou deliciosamente imprevisível! Viver é dar uma cambalhota, romper, rasgar, correr, aprender, amar ... buscar a felicidade! Penetrar no mundo de incertezas acreditando que nos levará ao objetivo desejado, porém, sabendo que novas incertezas virão! Afinal, o que é certo na vida? Viver é para os que tem coragem de buscar o seu sonho!
Sonhar é a bússola que nos faz navegar em nossos desejos e chegar lá!
Viver também se confunde com navegar, enfim, viver é correr riscos tanto quanto navegar!
Salve a poesia, salve o poeta Fernando Pessoa que tão inteligentemente fez a nossa mente dar uma cambalhota, e viva a falta de precisão da vida!




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Inspiração

Certamente não foi gerar uma confusão semântica entre precisão e necessidade, e sim fazer os leitores refletirem acerca da dinâmica da vida que não tem uma precisão matemática! Tanto viver quanto navegar significa correr riscos, até onde queremos chegar? Ah! Sonhar é a bússola que nos conduz nesses caminhos de escolhas e desejos.

Sobre a obra

Adoro ler poesia e história antiga. Rememorei numa delas uma correlação entre a frase dita pelo General Pompeu, no cumprimento da missão de abastecer Roma, e o poema de Fernando Pessoa, no qual ele escreve “navegar é preciso, viver não é preciso”. Como gosto de instigar o raciocínio dos leitores com temas ligados à dinâmica da vida, escrevi!

Sobre o autor

Eu adoro escrever, principalmente sobre temas filosóficos e que fazem o leitor refletir sobre o seu comportamento diante da vida.
Desde criança escrevo contos, poesias, crônicas, e continuo desenvolvendo essa habilidade.
Como estou aposentada, tenho mais tempo para exercitar a criatividade, e assim me dedicar às composições literárias.

Autor(a): MARIA DE LOURDES SANTOS ARAUJO (Lourdinha Araujo)

APCEF/BA