Talentos

A festa de Gala

A festa de Gala
(Regina Guimmaraes)
Não sei como cabem tantos pensamentos ao mesmo tempo. Às vezes pensa demais. Chega a fugir do assunto principal. Parece antena parabólica na ventania.
Lembra-se da inscrição no curso pela internet, da oficina de textos à tarde, tem que deixar tudo organizado para o lanche da noite, daqui a pouco chega a hora do almoço e está sem creme de leite para finalizar o estrogonofe. Melhor fazer uma listinha para uma passada rápida no supermercado da esquina. Não pode esquecer de apanhar a roupa que deixou para ajuste na costureira.
Quase meio-dia, aproveita para lavar os cabelos. Tem vasta cabeleira. Se os lavar ao final da tarde, demorarão para secar, no outono a temperatura é mais baixa.
Pensa, corre, anota, telefona, agenda, faz o dia esticar ao máximo.
Mas quando está preguiçosa, fica devaneando, nada conclui. Mergulha nos seus escritos e vai ter com Dalí que lhe faz a proposta de conversarem com Gala a fim de organizarem a próxima festa em Cadaqués. Gala aceita de pronto e planeja uma festa para tornar o mundo de paz, ou vai ou racha; pretende convidar gregos e troianos. Stalin, Pinochet, Saddam, Videla, Pol Pot, Salazar, Franco, Id Amim, outros ditadores, presidentes de países em guerra, maus governantes, postulantes à reeleição... e, para garantir o bom convívio entre eles: água benta. E que de lá não saiam antes da festa acabar, que de lá não saiam antes de um acordo de paz para o mundo. Para garantir, ficarão de guarda ao redor da casa os maiores leões da África. No caso de tentativa de fuga, aves carniceiras sobrevoarão os céus da casa, de longe percebem o cheiro da maldade que eles exalam, e os deterão. Gala diz que estes convidados são espíritos maus que se juntarão ao para um momento de paz, ou será que se devorarão? Continua, -- Nós apenas observaremos, não seremos vistos, porque a festa é deles. Caso algum arrisque tramar qualquer ação nociva à humanidade, tocará uma sirene ensurdecedora e este perderá a voz imediatamente e ficará na cor roxa. Se o inconformismo bater, ficará paralisado para juntar-se a outros e virar obra viva de Dalí: Ode à paz.
A campainha toca, Suzette assusta-se, cai da rede e sai catando cavaco até chegar à porta. A mãe, que lhe trouxera uma sopa bem quentinha.

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Inspiração

O Surrealismo é inesquecível. Tal vanguarda propunha representar não a realidade, mas o sonho. Os artistas, influenciados por Freud, acreditavam que a realidade, de fato, era aquela que se manifestava no sonho e no pesadelo. Ali estariam os conteúdos recalcados da sociedade que poderiam ser captados pelos artistas.

Sobre a obra

O improvável. A ilogicidade. Os surrealistas teriam a obrigação de trazer à tona aquilo que a sociedade burguesa queria esquecer. Em Paris, 1924, manifestavam uma postura antiburguesa pautada numa atitude anárquica perante a realidade. Estimulavam a criação que se aproximasse do método freudiano de livre associação de ideias.

Sobre o autor

Regina Guimmaraes é Bacharel em Pintura pela Escola de Belas Artes da UFRJ. Acadêmica da ABBA - Academia Brasileira de Belas Artes, Membro do PEN Clube do Brasil, faz parte da Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil - AJEB-RJ, Círculo Literário do Forte de Copacabana, APP - Associação Portuguesa de Poetas, dentre outros.

Autor(a): REGINA CELIA MUNIZ GUIMARAES (REGINA GUIMMARAES)

APCEF/RJ