Talentos

O Vôo que ainda não veio

O vôo que ainda não veio
Hoje acordei com o coração transbordando de amor. Não sei de onde veio, como surgiu, não ouvi nenhuma canção ou cheiro de café. A casa estava em silêncio mas senti uma vibração boa crescendo em mim, uma força quase santa, um querer imenso pela vida. Que grandeza esse dentro querendo sair... Será isso o que a raiz sente quando brota da terra e descobre a luz?
Descobrir-se vivendo parece ser o mais feliz e mais legítimo dos gozos, uma espécie de tomada da consciência que vive, é compreender-se agente da possibilidade de garantia da Existência, feito uma energia que não se basta e precisa correr mundo. É alcançar a instância mais legítima da expectativa plural da vida, inclusiva, generosa, que se traduz num direito pleno em busca da autodeterminação dos sujeitos, seus corpos e seus saberes. A todas e todos o direito a Ser e Ser inteiro.
Inteiro é o mundo e logo me sinto um pássaro de muitas asas que gosta de voar em bando, que quer gorjear a plenos pulmões, rasgando o céu na figura da fêmea em busca de suas crias pelos varais. Saí pelo corredor a procura de você, o pássaro das asas mais leves que conheço, mas meu vôo se esvaeceu assim que alcancei a sala e o encontro encolhido no sofá da sala, o corpo esquecido num sono que sei que acabou de começar. Aperta-me o peito vê-lo assim, distante da luz, apartado do imediato e de todas as certezas tão em voga em nossos dias. Perdi o céu. Conheço bem esse ritual, o desencontro das horas, as linguagens entrecortadas pela complexidade dos nossos silêncios. O cansaço das "horas vãs".
No fundo eu sei, na vida nada é vão, nem mesmo meu desencanto, e o silêncio costuma ser um bom descanso para quem já conta com os traçados do tempo. Ele nunca me falta e me espera arriar cada um dos sentidos do meu corpo.
Prendo inevitavelmente a respiração e vou amparando, uma a uma, as vibrações que já começam a se recolher.
Recolher fragmentos, é isso que mais tenho feito, e tenho a impressão que vou guardando todos eles nas minhas caixas de silêncios. Um cômodo inteiro de cortinas arreadas e caixas empoeiradas. Sento no chão bem devagar e, solenemente, vou acomodando dentro delas, uma a uma, cada palavra que não se impôs, todas vencidas nos interditos do cotidiano. O silêncio é a linguagem universal de todo aquele que experimenta o amor incondicional. Esse pressentir que não é negligência e nem fraqueza, é simplesmente amar sem condição. É mais que um propósito, é um critério já dado. Diante dele não há razão que prevaleça ou que faça sentido, não há o que escolher, a não ser, a companhia da solidão.
Já me convenci de que o silêncio é uma invenção do tempo para aliviar as aflições do mundo, a espera confidente. Uma espera que antecipa a falta, protege a ausência. É a vigília do distante. Aquele que está mas não se mostra.
No céu tudo parece muito longe, mas o infinito tem o quê de muito perto e olhos para quem quer ver. Faço dele um manual, é através dele que me solidarizo e pactuo com a inteireza do seu Ser, suas asas saudosas de você.
Eu apenas recolhi minhas asas, aprendi que não há apenas um vôo perfeito, não existe a última vez. Silencio pra te alcançar...
Espero para compreender, espero por acreditar, espero porque o mundo sempre chega com você.

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Inspiração

uma experiência real que vivi em casa

Sobre a obra

O amor incondicional de uma mãe. As técnicas do coração

Sobre o autor

escrever é um refugio.

Autor(a): ANGELA MARIA FASSINA BARONE THEBALDI (Angela Barone)

APCEF/ES