Alma gêmea

Alma gêmea

E lá estava Guilherme sentado na mesa do bar olhando para a garrafa de cerveja lamentando mais um dos muitos términos de relacionamento que tivera na vida. Daquela vez foi um que parecia muito promissor. Gui, como era chamado, nutriu grandes expectativas naquele namoro. Porém, era visível por todos ao seu redor que aquele relacionamento não daria certo, apesar de toda sua entrega e dedicação. Era o típico “relacionamento outdoor”, que é aquele casal que tem um imenso outdoor sobre eles com letras garrafais dizendo: “NÃO VAI DAR CERTO”. Apesar do amor que existia entre eles, eram totalmente diferentes. Ele era todo cheio de convicções, planos e dedicação ao que estavam tentando construir. Ela era cheia de dúvidas, confusões e dificuldade para se apegar.
Um problema do Gui, quando se tratava de relacionamentos, era que ele acreditava firmemente em algumas ideias românticas ao ponto de não enxergar outras variáveis. Uma dessas ideias era que um relacionamento com uma colega de trabalho seria ótimo, pois teriam sempre um assunto em comum sobre o qual conversar, teria alguém que entenderia seu estresse. Namorou sua colega Natália, estava certo em relação à praticidade do namoro, porém existia outra variável chamada “temperamento de Natália”, que depois de certo tempo assustou Gui. Acreditava que namorar uma mulher madura era bom, pois eram mais seguras, independentes e não deixam ninguém se meter no relacionamento. Namorou Maria, dez anos mais velha. Porém, ele tentou também parecer maduro ao criar um personagem, óbvio que não deu certo.
Naquele dia, no bar, sentou ao seu lado Denise, que percebendo a desolação de Gui, procurou ouvi-lo empaticamente. Ela disse a ele que acreditava em alma gêmea, que existia uma razão para o universo o colocar exatamente naquela cidade, naquele lugar, razão esta que era tornar mais fácil a tarefa das almas se encontrarem. E se ele ainda não tinha dado certo com alguém, é porque ainda não havia encontrado sua alma gêmea e que para os caminhos se cruzarem, ele teria que estar mais aberto a novas experiências, com o coração leve, deixar o passado para trás, se fizesse isso, o universo iria trabalhar para que ele esteja no lugar certo e na hora certa para encontrá-la. Por alguma razão, aquela conversa estranha com aquela garota esotérica havia o deixado melhor. Gui agradeceu pela conversa e foi para casa pensativo. Eis que ele teria mais um incrível ideia baseada numa ideia romântica que ouviu de uma desconhecida no bar: decidiu procurar sua alma gêmea. E para isso bolou um mirabolante plano.
Gui começou a acreditar firmemente que sua alma gêmea estava em algum lugar esperando para ser encontrada por ele e estava determinado a encontrá-la. Com um plano que em sua cabeça fazia total sentido, começou a botá-lo em prática. Para facilitar sua busca, delimitou uma área, afinal o mundo é muito grande, então sua alma gêmea estaria próxima dele, numa área de no máximo 30 km de sua casa, que incluiria na sua busca as cidades vizinhas. Então começou sua busca, primeiramente, começou pelas redes sociais e aplicativos de namoro. Marcou vários encontros, conheceu muitas mulheres interessantes. Porém, depois de alguns encontros, percebeu que não bastava encontrá-la, precisava saber, ter certeza que era sua alma gêmea, mas como saber? Como ter certeza? Depois de muito refletir, teve uma ideia, digitou no Google: “como saber se a pessoa é minha alma gêmea”. E suas respostas vieram: “Comunicação sem palavras, você sente nas entranhas que encontrou sua ‘metade da laranja’, a química física entre vocês é palpável, vocês dois se sentem totalmente à vontade um com o outro, ele ou ela desafia você mais que qualquer outra pessoa”. Logo após, pesquisou “o que é entranhas”.
Tendo suas dúvidas esclarecidas, continuo sua busca. Lembrou do que a estranha no bar lhe disse sobre estar aberto a novas experiências. Então, começou a interagir com pessoas de fora do seu círculo social, começou a fazer curso de artesanato em argila, ler livros de ficção, mudou de emprego, mudou de apartamento, entrou numa ONG que ajudava sem tetos.
Certa vez, no inverno, estava distribuindo sopa para os sem-teto, num dia que haviam muitos para serem servidos e poucos para servir, estava uma confusão, todos estavam reclamando da demora, naquela hora, passando por ali estava Fernanda, que vendo os voluntários no sufoco, resolveu ajudá-los. Gui ficou muito grato e a convidou para um café no dia seguinte, Fernanda aceitou. Então saíram, conversaram sobre a vida, sobre sonhos, sobre o universo. Ambos se gostaram e se apaixonaram, namoraram e viveram felizes...pelos próximos seis meses.
Foi uma paixão fulminante, mas depois de seis meses, Gui terminou com ela. Não se sabe exatamente o motivo, mas tem a ver com algo sobre não sentir as entranhas. Sabe –se que ele ficou triste, mas com a consciência tranquila, pois fez o que achou certo.
Após o término, foi para o bar tomar sua cervejinha, assistir seu futebol. Apesar de tudo, não estava triste, percebeu que para estar feliz, não precisa estar acompanhado, só precisava estar em paz. Naquele dia, apareceu Denise, que se lembrou dele e perguntou como ele estava. Gui a reconheceu e disse que estava bem. Os dois beberam e assistiram ao futebol juntos, trocaram telefone, saíram outras vezes, descobriram tantas coisas em comum, se sentia tranquilo ao lado dela, conversavam por horas, sentiam-se a vontade ao lado do outro mesmo em silêncio, ambos riam de suas piadas, sentiam-se livres, podiam ser eles mesmos, era tudo mais fácil, mais simples. Era ela.

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Inspiração

A ideia da obra desde ano surgiu através da observação empírica de relacionamentos modernos, de suas nuances e percepções.

Sobre a obra

A obra trata-se de um crônica em terceira pessoa em que mostra, através do personagem principal, uma pessoa normal que busca algo que a maioria das pessoas busca: um relacionamento "perfeito".

Sobre o autor

Através da escrita consigo expressar sentimentos vindos de observações cotidianas.

Autor(a): GERIO COELHO BRAGA (Gério Braga)

APCEF/AP