CICLO INFINITO

Acordei hoje com a sensação de que o mundo estava em um ritmo diferente do meu. O despertador tocou como de costume, mas o som parecia mais insistente, quase desesperado. Levantei-me automaticamente, como um soldado atendendo ao chamado de um comandante invisível: Ah, o relógio, esse tirano, que dita cada movimento, cada decisão, cada respiração.
A rotina matinal seguiu seu curso: banho rápido, café engolido em goles apressados, e a corrida para pegar o ônibus que, como sempre, já estava lotado. A rotina é uma sequência cronometrada de ações: vestir, comer, correr.
No caminho, observei os rostos ao meu redor. Olhos semicerrados, olheiras profundas, expressões cansadas. Todos pareciam prisioneiros de um ciclo interminável de compromissos e prazos. A vida moderna, percebi, é uma maratona sem linha de chegada. Corremos, corremos, mas nunca chegamos.
No trabalho, a correria continuava. Pilhas de documentos, e-mails intermináveis, reuniões que mais pareciam sessões de tortura. Cada tarefa concluída cedia lugar a outra, enquanto o relógio na parede parecia zombar de nós, avançando implacavelmente, enquanto tentávamos, em vão, acompanhá-lo.
Almocei rapidamente, como de costume, enquanto respondia a mais algumas mensagens. A sensação de cansaço era uma constante. Da janela da cozinha, vi a cidade em seu frenesi habitual: carros buzinando, pessoas apressadas, sirenes ao fundo. Era como se todos participássemos de uma corrida na qual ninguém queria vencer.
Quando o dia finalmente terminou, a exaustão já era quase palpável. O retorno para casa espelhava a jornada matinal, mas com um toque de exaustão adicional: o ônibus estava novamente lotado, os rostos ainda mais abatidos, os corpos curvados pelo peso do dia. Cheguei em casa, na ilusão de descansar, mas o que me aguardava era mais trabalho — as tarefas domésticas, as responsabilidades familiares.
Ao deitar na cama, pensei em como a vida moderna nos transformou em autômatos. Movemo-nos por inércia, sem tempo para respirar, para pensar, para viver de verdade. O sono, finalmente, chega como uma promessa de alívio, mas mesmo ele é muitas vezes perturbado. Sonhos agitados, preocupações que persistem, o corpo que não consegue relaxar completamente.
Acordarei amanhã e esse ciclo implacável se repetirá, dia após dia, numa rotina que parece não ter fim. A pressa, eterna companheira, e o cansaço, fiel sombra, seguirão de perto cada passo, lembrando-me que, na busca incessante por mais tempo, estou, na verdade, perdendo o que há de mais precioso: a própria vida.
Quem sabe, um dia, teremos a chance de desacelerar, de apreciar os momentos simples, de viver com mais calma e mais serenidade. Até lá, continuaremos nesta maratona insana, mesmo sem saber ao certo por que estamos correndo.

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Inspiração

O texto aborda o ritmo frenético da vida moderna, com uma reflexão pessoal sobre a rotina acelerada, o cansaço, e a sensação de perda de controle sobre o tempo.

Sobre a obra

Uma crônica de tom introspectivo e filosófico. O texto reflete sobre um estado emocional e um aspecto da vida cotidiana e o final sugere a necessidade de desacelerar e valorizar os momentos simples da vida.

Sobre o autor

Acredito que a arte, em todas as suas formas, tem a capacidade de tocar as pessoas de maneira profunda e transformadora. Considero uma forma de expressar meus pensamentos e minhas observações sobre o mundo ao meu redor. Agradeço a oportunidade de dividir o meu universo criativo com um público tão especial.

Autor(a): GICELI DEMUNER DE SOUZA (Giceli Demuner de Souza)

APCEF/ES


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